Há alguns dias, citei o novo trailer de Horton Hears a Who, o novo da Bluesky. Não fui suficientemente justo com esta produção, que merece um post só pra ela.
Após assistir várias vezes, decidi escrever um pouco sobre um aspecto da produção que agradou muito: a composição das cenas.
Sim, a animação é estupenda, a modelagem assimétrica é linda e o render que se afasta do fotorrealismo são outras características que colocam o filme como forte candidato à melhor animação de 2008. Destaco a ótima composição das cenas por ser algo menos óbvio, mais difícil de achar hoje em dia, e - mesmo assim - extremamente importante para fazer deste filme algo brilhante.
O pessoal do estúdio realmente pensou no resultado como um todo, e não como várias partes separadas. Keith Lango escreveu sobre este problema em 2006, vale a leitura.
É possível fazer rigs que ofereçam uma liberdade fantástica, modelagens hiper detalhadas, iluminações perfeitas e animações maravilhosas. Juntar isso tudo em uma cena é bem mais difícil, e a Bluesky conseguiu. Vejam alguns screenshots que tirei e comentei:
O cenário desfocado possui uma construção que guia os olhos do espectador para o assunto principal da cena: a flor em que o grão pousa. O destaque visual respeita a regra dos terços, fazendo uma composição muito boa. Destaquei em vermelho o caminho sugerido pelo cenário e as guias que marcam a regra dos terços.
Aqui a porta cria uma moldura para guiar os olhos ao assunto principal, e não há informações concorrentes. Veja que a estante dos livros ao fundo é inclinada para a direita, como uma "seta" que indica qual deve ser o centro da atenção.
Aqui tanto os prédios da cidade quanto a construção guiam o olhar para o personagem, que caminha para a linha do "terço" da esquerda.

As folhas das árvores aqui são cuidadosamente posicionadas para não competir visualmente com o pequeno roedor azul, criando uma moldura para ele. Horton - o personagem principal - ganha destaque não apenas pelo tamanho, mas também pela posição que ocupa na grade.
Esta é uma das minhas preferidas: veja como a mão está no ponto de principal destaque da cena e como as escritas do quadro-negro fazem um espiral até ela.
Outro uso bacana dos terços. O tampo da mesa ocupa a linha que demarca o terço inferior, enquanto a cientista ocupa a linha vertical do terço da direita. Ambos criam uma moldura para o prefeito, enquanto a perspectiva do quadro negro indica o caminho a ser percorrido pelo olhar.

Tem como não ver o boneco de neve derretido? As casas e a água criam uma moldura, as duas crianças ficam em cada terço vertical e a escada termina de indicar para onde devemos olhar. =)
Para finalizar, uma cena em que Horton não está em nenhum dos terços, mas a moldura que o cenário cria e a ausência de concorrência visual fazem com que tudo funcione perfeitamente.
Pode ser apenas um trailer, mas podemos aprender um bocado com ele. =)